sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Fallen: Capítulo 4 "Turno do cemitério"

 https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiFQlzCLByW81ee2nL9QLnRGnqgLLYXluHJV7vzAxXDwKqAefp5yXO4dLPrp2eaAGz2V17c6vXpOhk_vp9J8L2lFi7iavurNKVMYUxBLN6EhHIWSiA_C_018xImr_opBQJaQHYGYUOPJw8/s1600/imagens-lindas-tumblr-428_thumb.jpg

Desde que Luce podia se lembrar, terças-feiras de verão significavam café fresco, tigelas cheias de framboesa com chantilly, e uma interminável pilha de waffles dourados e crocantes. Mesmo este verão, quando seus pais começaram a sentir um pouco de medo dela, o dia do waffle era algo com que ela podia contar. Ela podia rolar na cama na terça-feira, e antes de pensar em qualquer outra coisa, instintivamente ela sabia que dia era.
Luce inalou, retomando lentamente a seus sentidos, então ela inalou de novo com um pouco mais de vontade. Não, não havia nenhum leitelho batido, nada além do cheiro de vinagre da pintura descascada. Ela mandou o sono para longe e captou a vista de seu dormitório apertado. Isso parecia como a foto de “antes” em um show de renovação de casa. O longo pesadelo que foi a segunda-feira retornou à ela: eles tomarem seu celular, o incidente com o bolo de carne e os olhos brilhantes de Molly no refeitório, Justin expulsando-a da biblioteca. O que foi que o fez ficar tão rancoroso, Luce não tinha a menor ideia.
Ela sentou para olhar pela janela. Ainda estava escuro; o sol não tinha sequer saído pelo horizonte ainda. Ela nunca tinha acordado tão cedo. Se duvidasse, ela realmente não achava que conseguia se lembrar de já ter visto o nascer do sol. Sinceramente, algo sobre assistir-o-nascer-do-sol como uma atividade sempre a deixava nervosa. Eram os momentos de espera, os momentos logo-antes-do-sol-surgir-no-horizonte, sentada na escuridão olhando através das linhas das árvores. O horário nobre das sombras.
Luce suspirou audivelmente com saudades de casa, um suspiro de solidão, o que a deixou com ainda mais saudade e solitária. O que ela iria fazer durante as três horas entre o raiar do dia e a sua primeira aula?
Raiar do dia – por que essas palavras zumbiam em seus ouvidos? Ah. Droga. Ela deveria estar na detenção.
Ela saltou para fora da cama, tropeçando em sua mala ainda-cheia, e arrancou outro suéter preto tedioso do topo da pilha de suéteres pretos tediosos. Ela colocou o jeans preto que usou ontem, estremeceu quando teve um vislumbre do desastre que estava sua cabeça, e passou os dedos pelo seu cabelo enquanto corria pela porta afora.
Ela estava ofegante quando chegou aos portões de ferro forjado, da altura da cintura e complexamente esculpidos, do cemitério. Estava engasgada com o cheiro esmagador de mato e se sentindo muito sozinha com seus pensamentos. Onde estavam os outros? A definição de “início da manhã” deles era diferente da dela? Ela olhou para seu relógio. Já eram seis e quinze.
Tudo o que eles tinham dito a ela era para se encontrarem no cemitério, e Luce tinha bastante certeza de que essa era a única entrada. Ela estava na divisa, onde o asfalto áspero do estacionamento dava lugar a um terreno destruído cheio de ervas daninhas. Ela notou um dente-de-leão solitário, e passou pela sua mente que uma Luce mais jovem teria pulado sobre ele e então feito um desejo e soprado. Mas agora os desejos dessa Luce pareciam pesados demais para algo tão leve.
Os portões delicados eram tudo o que dividia o cemitério do estacionamento. Incrível para uma escola com tanto arame farpado em todo o lugar. Luce passou a mão ao longo dos portões, seguindo o padrão floral ornamentado com seus dedos. Os portões deviam datar dos dias da Guerra da Secessão de que Ariane falara, quando o cemitério era utilizado para enterrar os soldados caídos. Quando a escola se juntou a ele, não era um lugar para loucos instáveis. Quando o lugar todo era muito menos cheio e sombrio.
Isso era estranho – o resto do terreno era plano como uma folha de papel, mas de alguma forma, o cemitério tinha um formato côncavo, parecido com uma tigela. Daqui, ela podia ver a inclinação de toda a vastidão a partir dela. Fileira após fileira de lápides simples alinhavam-se nas inclinações como espectadores em um estádio. Mas em direção ao centro, no ponto mais baixo do cemitério, o trecho através do terreno se torcia em um labirinto de grandes túmulos esculpidos, estátuas de mármore e mausoléus.
Provavelmente para oficiais da Confederação, ou apenas para soldados que tinham dinheiro. Pareciam que seriam bonitos vistos de perto. Mas vistos dali, o simples peso deles parecia arrastar o cemitério para baixo, quase como se todo o lugar estivesse sendo engolido por um ralo.
Passos atrás dela. Luce girou ao seu redor para ver uma figura pequena e grossa, vestida de preto, surgir de trás de uma árvore. Penn! Ela teve de resistir ao desejo de jogar seus braços em volta da garota. Luce nunca tinha ficado tão contente em ver alguém – embora fosse difícil acreditar que Penn tivesse pego alguma detenção.
— Você não está atrasada? — Penn perguntou, parando alguns metros à frente de Luce e dando a ela um aceno divertido de sua-pobre-novata com a cabeça.
— Eu estou aqui há 10 minutos — Luce falou. — Não é você quem está atrasada?
Penn sorriu.
— De jeito nenhum, eu sou apenas uma madrugadora. Eu nunca peguei detenção. — Ela deu de ombros e empurrou seu óculos roxo para cima em seu nariz. — Mas você pegou, junto com outras cinco almas infelizes, que provavelmente estão ficando mais irritadas a cada minuto que esperam por você lá embaixo no monólito.
Ela ficou na ponta dos pés e apontou para trás de Luce, em direção a maior estrutura de pedra, que se levantava do meio da parte mais profunda do cemitério. Se Luce apertasse os olhos, ela poderia notar um grupo de figuras negras agrupadas em torno de sua base.
— Eles apenas disseram para se encontrar no cemitério — Luce falou, já se sentindo derrotada. — Ninguém me disse para onde ir.
— Bem, eu estou dizendo para você: monólito. Agora desça até lá — Peen falou. — Você não vai fazer muitos amigos acabando com a manhã deles mais do que você já acabou.
Luce engoliu em seco. Parte dela queria pedir a Penn para lhe mostrar o caminho. Daqui de cima, aquilo parecia um labirinto, e Luce não queria ficar perdida no cemitério. De repente, ela ficou com aquela sensação nervosa, de estar longe de casa, e ela sabia que isso só iria piorar lá. Ela estalou suas juntas, retardando.
— Luce? — Penn disse, dando um pequeno empurrão em seus ombros. — Você ainda está parada aqui.
Luce tentou dar uma Penn um sorriso corajoso de agradecimento, mas teve que se contentar com um estranho tique facial. Então ela correu para baixo da encosta para o coração do cemitério.
O sol ainda não tinha nascido, mas estava quase, e estes últimos momentos antes do amanhecer sempre eram os que mais a assustavam. Ela passou rápido pelas fileiras de lápides simples. Em um ponto elas deviam ter estado retas, mas agora elas eram tão velhas que a maioria delas tombava para um lado ou para o outro, dando ao lugar todo, uma aparência de jogo de dominó mórbido.
Ela passou seu tênis Converse preto pelas poças de lama, esmagando folhas mortas. Na hora em que passou pela área mais simples e chegou até os túmulos mais ornamentados, a terra tinha mais ou menos sido achatada, e ela estava totalmente perdida. Ela parou de correr, tentou recuperar o fôlego. Vozes. Se ela se acalmasse, ela poderia ouvir vozes.
— Mais cinco minutos, então eu vou cair fora — disse um rapaz.
— Pena que a sua opinião não tenha valor, Sr. Sparks.
Uma voz teimosa, uma que Luce reconheceu de suas aulas de ontem. Sra. Troz – a Albatroz. Após o incidente com o bolo de carne, Luce tinha chegado tarde para a aula dela e não tinha dado exatamente a impressão mais favorável para a professora severa e esférica de ciência.
— A não ser que alguém queira perder seus privilégios sociais esta semana — gemidos entre os túmulos — vamos todos esperar pacientemente, como se não tivéssemos nada melhor para fazer, até a senhorita Price decidir dar a graça de sua presença para nós.
— Eu estou aqui — Luce arfou, finalmente contornando uma estátua gigante de um querubim.
Sra. Troz estava com as mãos nos quadris, vestindo uma variação do vestido preto florido e solto de ontem. Seu escasso cabelo cor castanho-rato estava puxado na sua cabeça e seus tediosos olhos castanhos mostravam apenas aborrecimento com a chegada de Luce. Biologia sempre foi difícil para Luce, e até agora, ela não estava fazendo nenhum favor à sua nota na classe Sra. Troz.
Atrás da Albatroz estavam Ariane, Molly e Roland, espalhados ao redor de um círculo de blocos que encaravam uma grande estátua central de um anjo. Em comparação com o resto das estátuas, esta parecia mais nova, mais branca, mais grandiosa. E encostado na coxa esculpida do anjo – ela quase não tinha percebido – estava Justin.
Ele estava vestindo a jaqueta de couro preta e o cachecol vermelho vivo que a tinha deixado fixada ontem. Luce tomou conhecimento de seu cabelo dourado desarrumado, que parecia não ter sido penteado depois dele acordar... o que a fez pensar sobre como Justin ficava quando estava dormindo... o que a fez corar tão intensamente que, do momento que seus olhos fizeram o caminho da linha do cabelo para os olhos dele, ela estava completamente humilhada.
Nesse momento ele estava olhando fixamente para ela.
— Sinto muito — ela deixou escapar. — Eu não sabia onde deveríamos nos encontrar. Eu juro...
— Pode parar — disse a Sra. Troz, passando o dedo em sua garganta. — Você já desperdiçou o bastante do tempo de todo mundo. Agora, tenho certeza que todos se lembram da indiscrição desprezível que vocês cometeram para estarem aqui. Vocês podem pensar sobre isso nas próximas duas horas enquanto trabalham. Se reúnam em pares. Vocês sabem o que fazer.
Ela olhou para Luce e soltou sua respiração.
— Ok, quem quer uma protegida?
Para o horror de Luce, todos os outros alunos olharam para seus pés. Mas então, depois de um minuto torturante, um quinto aluno entrou no campo de visão ao virar a esquina do mausoléu.
— Eu quero.
Cam. Sua camiseta preta com gola em “v” era justa em torno de seus ombros largos. Ele era quase trinta centímetros mais alto do que Roland, que se deslocou para o lado quando Cam empurrou e passou, caminhando na direção de Luce. Seus olhos estavam grudados nela enquanto ele andava para frente, movendo-se suave e confiantemente, tão à vontade em sua roupa de escola reformatória quanto Luce estava pouco à vontade. Parte dela queria desviar seus olhos, porque era embaraçosa a maneira que Cam olhava para ela na frente de todos. Mas por alguma razão, ela estava hipnotizada. Ela não poderia quebrar o seu olhar – até que Ariane pisou entre eles.
— Primeiro — ela falou. — Eu disse que vi primeiro.
— Não, você não disse.
— Sim, eu disse, você não me ouviu de seu poleiro estranho lá atrás. — As palavras se apressaram para fora de Ariane. — Eu a quero.
— Eu... — Cam começou a responder.
Ariane inclinou a cabeça com expectativa. Luce engoliu em seco. Ele ia chegar e dizer que ele a queria também? Eles não poderiam simplesmente esquecer isso? Fazer detenção com um grupo de três?
Cam acariciou o braço de Luce.
— Vou encontrar com você depois, ok? — ele disse a ela, como se fosse uma promessa que ela lhe pediu para fazer.
Os outros garotos pularam dos túmulos nos quais eles tinham sentado e marcharam em direção a um galpão. Luce os seguiu, agarrando-se em Ariane, que sem dizer uma só palavra entregou-lhe um ancinho.
— Então. Você quer o anjo vingador, ou os amantes carnais abraçados?
Não houve menção sobre os acontecimentos de ontem, ou do bilhete da Ariane, e Luce de algum modo não sentia que deveria puxar esse assunto com Ariane agora. Em vez disso, ela olhou para cima e viu-se rodeada por duas estátuas gigantes. A mais próxima dela parecia um Rodin. Um homem nu e uma mulher estavam enlaçados em um abraço. Ela tinha estudado escultura francesa em Dover, e sempre pensou que as peças de Rodin eram as mais românticas. Mas agora era difícil olhar para os amantes abraçados sem pensar em Justin.
Justin. Que a odiava. Se ela precisasse de mais uma prova disso depois que ele basicamente fugiu da biblioteca à noite, tudo o que tinha que fazer era voltar a pensar no novo olhar fulminante que ela tinha ganhado dele esta manhã.
— Onde está o anjo vingador? — ela perguntou a Ariane com um suspiro.
— Boa escolha. Por aqui.
Ariane levou Luce para uma enorme escultura de mármore de um anjo salvando o solo da fúria de um raio. Ela pode ter sido uma peça interessante, no dia em que foi esculpida. Mas agora ela só parecia velha e suja, coberta de lama e musgo verde.
— Eu não entendi — Luce falou. — O que vamos fazer?
— Vamos dar uma esfregadinha — Ariane respondeu, quase cantando. — Eu gosto de fingir que eu estou lhes dando um banhozinho.
Com isso, ela escalou o anjo gigante, balançando as pernas ao longo do braço da estátua que impedia o raio, como se o negócio todo fosse apenas um carvalho grosso e velho para ela escalar.
Com medo de parecer que ela estava querendo mais encrenca com a Sra. Troz, Luce começou a trabalhar com seu ancinho em toda a base da estátua. Ela tentou limpar o que parecia ser uma interminável pilha de folhas úmidas.
Três minutos depois, os braços dela a estavam matando. Ela definitivamente não estava vestida para este tipo de trabalho manual lamacento. Luce nunca tinha sido enviada para a detenção na Dover, mas de acordo com o que ela tinha escutado, consistia em encher um pedaço de papel com "Eu não vou plagiar coisas da Internet" algumas centenas de vezes.
Isto era brutal. Principalmente quando tudo o que ela realmente tinha feito foi topar com Molly acidentalmente no refeitório. Ela estava tentando não fazer um julgamento precipitado aqui, mas limpar a lama de sepulturas de pessoas que tinham morrido há mais de um século? Agora Luce odiava sua vida totalmente.
Em seguida, raios de sol finalmente filtraram-se através das árvores, e de repente havia cor no cemitério. Luce sentiu-se instantaneamente mais leve. Ela podia ver mais de três metros na frente dela. Ela podia ver Justin... trabalhando lado a lado com Molly.
O coração de Luce afundou. O sentimento de leveza desapareceu.
Ela olhou para Ariane, que lançou-lhe um olhar de simpatia do tipo isso-é-um-saco, mas continuou trabalhando.
— Hey — Luce falou em voz alta.
Ariane colocou um dedo sobre os lábios, mas gesticulou para Luce subir ao lado dela.
Com muito menos graça e agilidade, Luce agarrou o braço da estátua e se balançou para cima do pedestal. Uma vez que estava quase certa que não iria cair no chão, ela sussurrou:
— Então... o Justin é amigo da Molly?
Ariane bufou.
— De jeito nenhum, eles totalmente se odeiam — ela disse rapidamente, e em seguida fez uma pausa. — Porque você está perguntando?
Luce apontou para os dois, não fazendo qualquer trabalho para limpar bem sua tumba. Eles estavam em pé perto um do outro, inclinando-se sobre seus ancinhos e tendo uma conversa que Luce desesperadamente desejava poder ouvir.
— Eles parecem amigos para mim.
— É a detenção — Ariane disse categoricamente. — Você tem que ficar em par. Você acha que Roland e Chester, o Molestador, são amigos?
Ela apontou para Roland e Cam. Eles pareciam estar discutindo sobre a melhor maneira de dividir o seu trabalho na estátua dos amantes.
— Companheiros de detenção não equivale a amigos na vida real.
Ariane olhou de volta para Luce, que podia sentir sua expressão caindo, apesar de seus melhores esforços para parecer imperturbável.
— Olha, Luce, eu não quis dizer... — ela dissipou a voz. — Ok, além do fato de você ter me feito perder uns bons vinte minutos da minha manhã, eu não tenho nenhum problema com você. Na verdade, eu acho que você é meio interessante. Um pouco nova. Dito isso, eu não sei o que você esperava em termos de amizade sentimental-piegas aqui no Sword & Cross. Mas deixe-me ser a primeira a te dizer, não é simplesmente assim tão fácil. As pessoas estão aqui porque têm bagagem. Eu estou falando de bagagem do tipo faça-seu-check-in, e-pague-a-multa-porque-tem-mais-de-vinte-e-dois-quilos. Entendeu?
Luce encolheu os ombros, sentindo-se envergonhada.
— Foi apenas uma pergunta.
Ariane riu nervosamente.
— Você é sempre tão defensiva? Que diabos você fez para entrar aqui, afinal?
Luce não tinha vontade de falar sobre isso. Talvez Ariane estivesse certa, seria melhor se ela não tentasse fazer amigos. Ela desceu e voltou a atacar o musgo na base da estátua.
Infelizmente, Ariane ficou intrigada. Ela saltou também, e trouxe seu ancinho em cima do de Luce para colocá-lo no lugar.
— Oh, me conta me conta me conta — ela provocou.
O rosto de Ariane estava muito perto do de Luce. Isso lembrou Luce do dia anterior, agachada sobre Ariane depois que ela teve a convulsão. Elas tinham tido um momento, não tinham? E parte de Luce queria muito ser capaz de contar a alguém. Esse tinha sido um longo e sufocante verão com seus pais. Ela suspirou, apoiando a testa na alça de seu ancinho.
Um gosto salgado de nervosismo encheu sua boca, mas ela não conseguiu engoli-lo. Da última vez que ela tinha entrado nesses detalhes, tinha sido por causa de uma ordem judicial. Ela teria se esquecido deles logo, mas quanto mais Ariane a encarava, mais claras as palavras ficavam, e elas ficavam mais perto da ponta da sua língua.
— Eu estava com um amigo uma noite — ela começou a explicar, dando uma respiração longa e profunda. — E uma coisa terrível aconteceu.
Ela fechou os olhos, rezando para que a cena não pudesse criar uma explosão de vermelho-e-preto em suas pálpebras.
— Houve um incêndio. Eu escapei... e ele não.
Ariane bocejou, muito menos horrorizada com a história do que Luce estava.
— De qualquer forma — Luce continuou — depois de tudo, eu não conseguia me lembrar dos detalhes, como isso aconteceu. O que eu pude lembrar – o que eu disse ao juiz, de qualquer maneira – eu acho que eles pensaram que eu era maluca.
Luce tentou sorrir, mas pareceu forçado.
Para sua surpresa, Ariane apertou seu ombro. E por um segundo, seu rosto pareceu realmente sincero. Depois ele mudou para um sorriso afetado.
— Nós somos todos tão incompreendidos, não somos? — Ela cutucou Luce no intestino com o dedo. — Você sabe, Roland e eu estávamos justamente falando sobre como nós não temos nenhum amigo piromaníaco. E todo mundo sabe que você precisa de um bom piro para levar a cabo qualquer pegadinha de reformatório que valha a pena. — Ela já estava planejando. — Roland pensou que talvez aquele outro novato, Todd, mas eu prefiro muito mais dividir meu fortúnio com você. Todos nós devemos colaborar em algum momento.
Luce engoliu em seco. Ela não era uma piromaníaca. Mas ela já estava cheia de falar sobre o seu passado; ela nem sequer quis se defender.
— Oh, espere até que Roland ouvir isso — Ariane disse, jogando seu ancinho para baixo. — Você é como o nosso sonho se tornando real.
Luce abriu a boca para protestar, mas Ariane já tinha ido. Perfeito, Luce pensou, ouvindo o barulho dos sapatos de Ariane andando pela lama. Agora era só uma questão de minutos antes de essas palavras viajarem por todo o cemitério até chegar a Justin.
Sozinha novamente, ela olhou para a estátua. Mesmo ela já tendo limpado uma enorme pilha de musgo e palha, o anjo parecia mais sujo do que nunca. Todo o projeto parecia tão inútil. Ela duvidava que alguém chegasse a visitar este lugar, de qualquer maneira. Ela também duvidava que qualquer dos outros detentos ainda estivesse trabalhando.
Seus olhos apenas caíram em Justin, que estava trabalhando. Ele estava usando muito diligentemente uma escova de aço para esfregar alguns mofos da inscrição em bronze em uma tumba. Ele tinha até mesmo levantado as mangas de seu suéter, e Luce podia ver seus músculos tensos enquanto ele trabalhava. Ela suspirou, e – ela não podia fazer nada quanto a isso – inclinou seu cotovelo contra o anjo de pedra para assisti-lo.
Ele sempre trabalhou duro.
Luce rapidamente balançou a cabeça. De onde isso tinha vindo? Ela não tinha ideia do que isso significava. E no entanto, tinha sido ela quem pensara sobre isso. Era o tipo de frase que por vezes formavam-se em sua mente antes que ela caísse no sono. Sussurros incompreensíveis que ela nunca podia conectar a qualquer coisa fora de seus sonhos. Mas aqui estava ela, bem acordada.
Ela precisava se segurar nessa coisa sobre o Justin. Ela o conhecia há um dia, e já podia sentir-se deslizando para um lugar muito estranho e desconhecido.
— Provavelmente é melhor ficar longe dele — disse uma voz fria atrás dela.
Luce virou ao redor para encontrar Molly, na mesma pose em que ela a achou ontem: as mãos nos seus quadris, as narinas com piercing queimando. Penn tinha dito a ela que a surpreendente decisão da Sword & Cross que permitia piercings faciais veio da própria relutância do diretor de remover o brinco de diamante que ele tinha em sua orelha.
— De quem? — ela perguntou a Molly, sabendo que ela tinha soado estúpida.
Molly revirou os olhos.
— Simplesmente confie em mim quando digo que ter uma queda por Justin seria uma ideia muito, muito ruim.
Ela sabia que o sol estava atrás de uma nuvem. Se ela pudesse quebrar o seu olhar, ela podia olhar para cima e ver isso por si mesma. Mas ela não conseguia olhar para cima, não conseguia desviar o olhar, e por alguma razão, ela tinha que apertar os olhos para vê-lo. Era quase como se Justin estivesse criando sua própria luz, como se ele estivesse a cegando. Um barulho oco encheu os seus ouvidos, e seus joelhos começaram a tremer.
Ela queria pegar seu ancinho e fingir que ela não tinha o visto chegando. Mas era tarde demais para se fingir de descolada.
— O que ela disse para você? — ele perguntou.
— Hum... — ela deu uma evasiva, forçando seu cérebro a criar uma mentira sensata. Não encontrou nada.
Ela estalou os nós dos dedos.
Justin colocou sua mão sobre a dela.
— Eu odeio quando você faz isso.
Luce empurrou-o para longe instintivamente. A mão dele sobre a dela tinha sido tão rápida, e ainda assim ela sentia o seu rosto corar. Ele quis dizer que isso era uma implicância dele, que o estalo de qualquer um iria incomodá-lo, certo? Porque dizer que ele odiava quando ela fazia isso implicava que ele já tinha visto ela fazer isso antes. E ele não poderia ter visto. Ele mal a conhecia. Então por que isso parecia com uma discussão que eles já tinham tido antes?
— Molly me disse para ficar longe de você — ela disse finalmente.
Justin inclinou a cabeça de lado a lado, parecendo considerar isto.
— Ela provavelmente está certa.
Luce estremeceu. Uma sombra pairou sobre eles, escurecendo o rosto do anjo apenas tempo suficiente para deixar Luce preocupada. Ela fechou os olhos e tentou respirar, rezando para que Justin não pudesse dizer que algo estava estranho. Mas o pânico estava crescendo dentro dela. Ela queria correr. Ela não podia correr. E se ela se perdesse no cemitério?
Justin seguiu o seu olhar para o céu.
— O que foi?
— Nada.
— Então você vai fazer isso? — ele perguntou, cruzando os braços sobre o peito, um desafio.
— O que? — ela disse. Correr?
Justin deu um passo na direção dela. Agora ele estava a menos de trinta centímetros de distância. Ela prendeu a respiração. Manteve o corpo completamente imóvel. Ela esperou.
— Você vai ficar longe de mim?
Isso quase parecia como se ele estivesse flertando.
Mas Luce estava completamente fora de ordem. Sua testa estava molhada de suor, e ela apertou sua têmpora entre dois dedos, tentando recuperar a posse de seu corpo, tentando pegá-lo de volta do controle dele. Ela estava totalmente despreparada para flertar de volta. Isto é, se o que ele estava fazendo era realmente flertar.
Ela deu um passo para trás.
— Eu acho que sim.
— Eu não ouvi você — ele sussurrou, levantando uma sobrancelha e dando um passo para mais perto.
Luce recuou novamente, para mais longe dessa vez. Ela praticamente bateu na base da estátua, e pôde sentir o pé de pedra arenosa do anjo raspando em suas costas. Uma segunda sombra, mais escura e mais fria, voou sobre eles. Ela poderia ter jurado que Justin estremeceu junto com ela.
E então o gemido profundo de algo pesado assustou os dois. Luce ofegou enquanto o topo da estátua de mármore balançava em cima deles, como um galho de árvore balançando ao vento.
Por um segundo, parecia pairar no ar.
Luce e Justin ficaram olhando para o anjo. Ambos sabiam que o seu caminho era para o chão. A cabeça do anjo inclinou-se lentamente em direção a eles, como se estivesse rezando – e depois a estátua inteira pegou velocidade enquanto começou a ser arremessada para baixo. Luce sentiu as mãos de Justin envolverem sua cintura instantaneamente, firmemente, como se ele soubesse exatamente onde ela começava e onde terminava. A outra mão cobriu a cabeça dela e forçou-a para baixo bem quando a estátua caiu sobre eles. Exatamente onde eles estavam. Ela caiu com uma queda maciça – de cabeça na lama, com os pés ainda repousando sobre a base, deixando um pequeno triângulo embaixo, onde Justin e Luce estavam agachados.
Eles estavam ofegantes, nariz com nariz, os olhos de Justin assustados. Entre os seus corpos e a estátua existia apenas alguns centímetros de espaço.
— Luce? — ele sussurrou.
Tudo o que ela podia fazer era acenar. Seus olhos se estreitaram.
— O que você viu?
Em seguida uma mão apareceu e Luce sentiu-se sendo puxada para fora do espaço embaixo da estátua. Houve uma raspagem nas suas costas e em seguida uma lufada de ar. Ela viu o lampejo de luz do dia novamente. A turma da detenção estava pasma, exceto a Sra. Troz, que olhava com raiva, e Cam, que ajudou Luce a ficar de pé.
— Você está bem? — Cam perguntou, correndo os olhos sobre ela procurando por arranhões e hematomas e tirando a sujeira de seu ombro. — Eu vi a estátua caindo e eu corri para tentar pará-la, mas já era... Você deve ter ficado tão apavorada.
Luce não respondeu. Apavorado era apenas uma parte de como ela se sentia. Justin, já de pé, nem sequer se virou para ver se ela estava bem ou não. Ele apenas foi embora.
O queixo de Luce caiu enquanto o observava ir, enquanto observava todos os outros parecem não se importar que ele tivesse ido embora.
— O que você fez? — Sra. Troz perguntou.
— Eu não sei. Em um minuto, nós estávamos lá — Luce olhou para a Sra. Troz — hum, trabalhando. Quando me dei conta, a estátua simplesmente caiu.
A Albatroz abaixou-se para examinar o anjo despedaçado. Sua cabeça tinha rachado no meio em uma linha reta. Ela começou a murmurar algo sobre as forças da natureza e pedras antigas. Mas foi a voz no ouvido de Luce que ficou com ela, mesmo depois de todos os outros terem voltado ao trabalho. Foi Molly, a apenas alguns centímetros de seu ombro, que sussurrou:
Parece que alguém deve começar a ouvir quando eu dou conselhos.

Continua...

4 comentários:

  1. ta perfeito, mas esta me dando medo, tipo "Turno do cemitério"...continua logo e por favor divulga --> http://imaginebelieberhotjbieber1994.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Que bom que você gosto, rsrs não precisa ficar com medo flor, vou postar o novo capitulo hoje mesmo e é claro que eu divulgo pra você :)

      Excluir
  2. Eu gostei muito...sou uma fã sua hahaha...

    ResponderExcluir