— O que
você está esperando? — Penn perguntou apenas um
segundo depois que Justin saiu com Roland. — Vamos.
Ela
puxou a mão de Luce.
— Para
onde? — perguntou Luce.
Seu
coração continuava batendo forte pela conversa com Justin – e da visão dele se
afastando. A forma em que seus esculpidos ombros cortavam o corredor fazia parecer
maior do que o próprio Justin.
Penn
bateu levemente em um lado da cabeça de Luce.
— Oi?
Para a biblioteca, como eu disse a você em meu bilhete... — ela
captou a expressão em branco de Luce. — Você
não recebeu nenhum dos meus bilhetes? — Ela
bateu a perna, frustada. — Mas eu entreguei a Todd para
passar ao Cam, para passar pra você.
— Correeeeio.
Cam se
meteu na frente de Penn e apresentou a Luce dois pedaços de papel dobrado
colocados entre o indicador e o dedo médio.
— Me dê
um descanso. Teu cavalo morreu de esgotamento no caminho? — Penn
bufou, recolhendo os bilhetes. — Eu te dei estes faz uma hora.
Por que levou tanto tempo? Você não os leu...
— Claro
que não — Cam levou uma mão a seu peito largo, ofendido. Ele usava um
grosso anel preto em seu dedo médio. — Se você
recorda, Luce se meteu em problemas por trocar bilhetes com Molly...
— Eu não
estava trocando bilhetes com Molly...
— Não me
importa — disse Cam, pegando os bilhetes da mão de Penn e entregando-os
finalmente a Luce. — Eu só estava olhando por seus
interesses. Esperando a oportunidade certa.
— Bem,
obrigada — Luce meteu os bilhetes em seu bolso e deu de ombros para Penn
como se dissesse “tanto faz.”
— Falando
de esperar o momento certo — ele continuou. — Eu
estava fora no outro dia e vi isto.
Ele
tirou uma pequena caixa de jóias de veludo vermelho e o manteve aberto para que
Luce visse. Penn deu um puxão no ombro de Luce com a intenção de dar uma
olhada.
Dentro,
uma fina corrente de ouro que envolvia um pequeno pingente circular com uma
linha esculpida no centro e uma pequena cabeça de serpente na ponta.
Luce
olhou para ele. Estava brincando com ela?
Ele
tocou no pingente.
— Pensei
que, depois do outro dia... queria te ajudar a enfrentar seu medo — ele
disse em um tom quase nervoso, com medo de que ela não fosse aceitar.
Ela deveria
aceitá-lo?
— Só uma
brincadeira. Eu gostei. É único, me lembrou você.
Era
único. E muito lindo, e isso fez Luce se sentir estranhamente indigna.
— Você
foi às compras? — Luce se encontrou perguntando, porque era mais fácil falar
de como Cam havia deixado o campus do que estar se perguntando Por que eu? — Pensei que uma das normas da
escola é que estamos todos presos aqui.
Cam
levantou o queixo ligeiramente e sorriu com os olhos.
— Há
maneiras — disse em voz baixa. — Eu te
mostrarei um dia. Poderia te mostrar... esta noite?
— Cam,
querido — disse uma voz atrás dele.
Era
Gabbe, batendo-lhe no ombro. Uma parte fina da frente de seu cabelo era uma
trança francesa e presa até atrás de sua orelha, como uma perfeita pequena
bandana. Luce a olhou com ciúmes.
— Preciso
de sua ajuda com os preparativos — Gabbe
ronronou.
Luce
olhou ao seu redor e percebeu que eram as únicas quatro pessoas que ficaram na
sala de aula.
— Vou dar
uma pequena festa em meu quarto mais tarde — Gabbe
anunciou, apertando o queixo no ombro de Cam para dirigir-se a Luce e a Penn. — E todos
estão indo, certo?
Gabbe,
cuja boca parecia sempre pegajosa pelo brilho labial, cujo os cabelos loiros
nunca paravam de deixar sua marca no segundo que um cara começava a falar com
Luce. Mesmo que Justin tenha dito que não havia nada entre eles, Luce sabia que
ela nunca iria ser amiga dessa garota.
Então
outra vez, você não tem que gostar de alguém para ir a sua festa, especialmente
quando certamente outra pessoa que você gosta, provavelmente vai está lá... Ou
ela deveria aceitar a oferta de Cam? Ele estava realmente sugerindo que eles
escapassem?
Só
ontem, um rumor tinha voado por toda a classe quando Jules e Phillip, o casal
língua furada, não apareceram para a aula da Srta. Sophia. Aparentemente, eles
tinham tentado sair do campus no meio da noite, para um encontro secreto que
saiu errado – e agora estavam em algum tipo de confinamento solitário, cuja
localização ainda não era conhecida por Penn.
O mais
estranho de tudo foi a Srta. Sophia – que geralmente não tolera os sussurros –
não calou os estudantes que fofocavam loucamente durante a aula. Era quase como
se quisesse que os estudantes imaginassem o pior castigo possível por quebrar
alguma de suas regras ditatoriais.
Luce
engoliu em seco, olhando para Cam. Ele ofereceu seu cotovelo, ignorando
inteiramente Gabbe e Penn.
— O que
me diz, garota? — ele perguntou, soando tão encantadoramente um clássico de
Hollywood que Luce se esqueceu de tudo o que tinha acontecido a Jules e a
Phillip.
— Desculpe
— Penn interrompeu, respondendo a ambos e afastando Luce do
cotovelo dele. — Mas nós temos outros planos.
Cam
olhou para Penn como se estivesse tentando descobrir de onde ela tinha vindo
tão repentinamente. Ele fazia Luce se sentir como uma versão melhor, mais
calma, de si mesma. E tinha uma maneira de cruzar em seu caminho no momento
certo depois que Justin a tinha feito se sentir exatamente o oposto. Mas Gabbe
ainda continuava flutuando ao lado dele, e o aperto de Penn era cada vez mais
forte, então finalmente Luce só agitou a mão que ainda estava segurando Cam.
—
Hum, talvez da próxima vez! Obrigada pelo colar.
Deixando
Cam e Gabbe confusos na sala atrás delas, Penn e Luce saíram de Agustine. Era assustador
estar sozinha no escuro edifício tão tarde, e Luce podia dizer pelos ruído
apressador das sandálias de Penn nas escadas que ela sentia o mesmo também.
Do lado
de fora, havia vento. Uma coruja cantava em sua pequena palmeira. Quando elas passaram
sob os carvalhos ao lado do edifício, ganchos desordenados de musgos espanhol tocaram-nas
como emaranhados de fios de cabelos.
— Talvez na
próxima vez? — Penn imitou a voz de Luce. — O que
foi isso?
— Nada...
eu não sei — Luce queria mudar de assunto. — Você fez
um som muito elegante, Penn — ela disse, rindo enquanto
caminhava ao longo do pátio.
— Outros
planos... pensei que você se divertiu na festa da semana passada.
— Se você
alguma vez andou lendo minha última correspondência, verá por que temos coisas
mais importantes em nosso prato.
Luce
esvaziou seus bolsos, descobrindo cinco M&M’s não-consumidos, e
compartilhando-os com Penn, que fez uma expressão muito Penn – como dizendo que
esperava que viessem de um lugar limpo, mas os comeu de todo jeito.
Luce
abriu o primeiro bilhete de Penn, no qual parecia uma cópia da página de um dos
arquivos da sala de arquivos subterrâneo:
Gabrielle Givens
Cameron Briel
Lucinda Prince
Todd Hammond
LOCALIZAÇÕES
ANTERIORES: Todos no Nordeste, com exceção de T. Hammond (Orlando, Flórida)
Ariane Alter
Justin Bieber
Mary Margaret Zane
LOCALIZAÇÕES
ANTERIORES: Los Angeles, Califórnia
O grupo
de Lucinda foi anotado que chegou em Sword & Cross em 15 de setembro deste
ano. O segundo grupo tinha chegado em 15 de março, três anos antes.
— Quem é
Mary Margaret Zane? — Luce perguntou, apontando.
— Apenas
a muito virtuosa Molly — Penn respondeu.
— O nome
de Molly é Mary Margaret? Não é de se estranhar que é tão irritada com o mundo — Luce comentou.
— Então, onde você consegue tudo isso?
— Peguei
de uma das caixas que a Srta. Sophia derrubou no outro dia — disse
Penn. — É a letra da Srta. Sophia.
Luce
olhou pra ela.
— O que
isso significa? Por que ela tinha a necessidade de guardar isso? Pensava que
eles tinham todas as nossas fichas de chegada separadas em nossos arquivos.
— Eles
tem. Não consigo entender isso também — Penn
respondeu. — E eu quero dizer, que embora você se apresentasse ao mesmo tempo
que os outros garotos, não é como se você tivesse algo em comum com eles.
— Eu não
poderia ter menos em comum com eles — Luce
disse, prevendo o olhar recatado de Gabbe sempre colado ao seu rosto.
Penn
coçou o queixo.
— Mas
quando Ariane, Molly e Justin apareceram, eles já se conheciam. Creio que eram
do mesmo Centro de Recuperação em Los Angeles.
Em
algum lugar existia uma chave para a história de Justin. Tinha que ser para ele
algo mais que um Centro de Recuperação na Califórnia. Mas pensando em como
seria sua reação – que desaparecesse ao horror que Luce poderia ter o interesse
de saber algo sobre ele – bem, a fez sentir que tudo o que ela e Penn estavam
fazendo era inútil e imaturo.
— Qual é
o ponto de tudo isso? — Luce perguntou, de repente
irritada.
— Não
posso imaginar por que a Srta. Sophia estaria conferindo toda essa informação.
Embora a Srta Sophia tenha chegado a Sword & Cross o mesmo dia que Ariane, Justin e Molly... — a voz de Penn abaixou. — Quem
sabe? Talvez isso não signifique nada. Aqui mencionam só um pouco de Justin nos
arquivos, imaginei que deveria te mostrava tudo o que encontrasse. Por tanto,
bilhete B.
Ela
apontou para o segundo bilhete na mão de Luce.
Luce
suspirou. Parte dela queria deixar a busca e parar de se sentir envergonhada
sobre Justin. Outra parte insistente dela ainda ansiava por conhecê-lo
melhor... o qual, estranhamente, era muito mais fácil de fazer quando ele não
estava tecnicamente presente para lhe dar novos motivos para sentir-se
envergonhada.
Ela
olhou para o bilhete, uma cópia de um cartão antigo da biblioteca.
Bieber, D. Os
Observadores: Mito Medieval
Europa. Seraphim
Press, Roma, 1755.
Número de
Identificação: R999.318 CR1
— Parece
que um dos antepassados de Justin foi um estudioso — Penn falou,
lendo por cima do ombro de Luce.
— Isso
deve ter sido o que ele quis dizer — Luce
disse em voz baixa. Olhou para Penn — ele me disse
que o estudo da religião estava em sua família. Isto deve ser o que ele quis
dizer.
— Pensei
que ele era órfão...
— Não
pergunte — Luce disse, agitando sua mão. — É um
tema delicado para ele — ela passou o dedo sobre o
título do livro. — O que um observador?
— Só há
uma maneira de descobrir. Embora possamos viver para lamentar. Porque isto
possivelmente parece com o livro mais chato de todos. No entanto — ela
acrescentou, batendo seus dedos em sua camisa. — Tomei a
liberdade de checar o catálogo. O livro deve estar nas estantes. Você pode me
agradecer mais tarde.
— Você é
boa.
Luce
sorriu. Estava ansiosa por chegar à biblioteca. Se alguém na família de Justin
tinha escrito um livro, não poderia ser chato. Ou não para Luce, de qualquer
modo. Mas então ela olhou outra coisa que tinha em sua mãos. A caixa aveluda de
jóias de Cam.
— O que
você acha que isso significa? — ela perguntou a Penn, enquanto
começava a caminhar até o mosaico de azulejos das escadas da biblioteca.
Penn
deu de ombros.
— Seus
sentimentos sobre as serpentes são...
— O ódio,
a agonia, a paranoia extrema e o desgosto — Luce
listou.
— Talvez
seja como... ok, eu costumava ter medo de cactos. Não podia nem me aproximar
deles... não ria, alguma vez foi picada por uma dessas coisas? Permanecem em
sua pele durante vários dias. Mesmo assim, um ano, no meu aniversário, meu pai
me presenteou com onze vasinhos de cactos. A principio eu queria desfazer-me
delas. Mas então, você sabe, me acostumei com elas. Deixei de dar a volta a
cada momento que eu estava próximo de um. No final, superei totalmente.
— Então
você está me dizendo que o presente de Cam é na verdade muito suave.
— Eu acho
— disse Penn. — Mas se eu soubesse que ele
estava louco por ti, eu não teria confiado nossa correspondência particular a
ele. Desculpe por isso.
— Ele não
está louco por mim — Luce começou a dizer, tocando
o pingente de ouro dentro da caixa, imaginando como seria o aspecto contra sua
pele, ela não tinha contado nada a Penn sobre seu dia de campo com Cam, porque
– bem, ela realmente não sabia o por que. Isto tinha haver com Justin, e como
Luce ainda não sabia se queria estar ou não estar – com qualquer um deles.
— Há — Penn
falou. — O que significa que você gosta um pouco dele! Traindo Justin. Eu
não posso continuar com você e seus homens.
— Como se
estivesse acontecendo algo com qualquer um deles — Luce falou
com tristeza. — Acha que Cam leu os bilhetes?
— Se ele
fez isso e ainda te deu esse colar, então
ele realmente gosta de você.
Elas
entraram na biblioteca e as pesadas portas duplas deram um golpe surdo atrás
delas. O som resoou na sala. A Srta. Sophia levantou a vista das montanhas de
papéis que cobriam sua mesa à fraca luz.
— Oh, oi,
garotas — ela cumprimentou, sorrindo de maneira tão ampla que Luce se
sentia culpada de novo pela bagunça que aconteceu durante sua aula. — Espero
que tenham desfrutado de minha breve sessão de estudos.
— Muito — Luce
assentiu com a cabeça, embora não tenha escrito nada a respeito. — Nós
viemos aqui para revisar algumas coisas antes do exame.
— Isso
mesmo — interveio Penn. — Você nos inspirou.
— Que
maravilhoso! — Sussurrou Srta. Sophia através de sua papelada. — Tenho
uma nova lista de leitura em alguma parte. Ficarei feliz em fazer uma cópia.
— Genial — mentiu
Penn, dando a Luce um pequeno empurrão até as estantes. — Nós a deixaremos
saber se precisarmos.
Do
outro lado da mesa da Srta. Sophia, a biblioteca estava em silêncio. Luce e
Penn seguiam olhando os números de identificação enquanto passavam de estante
em estante até os livros de religião. As lâmpadas que poupavam energia
detectavam o movimento e se acendiam a cada vez que cruzavam um corredor, mas
só a metade delas funcionavam. Luce percebeu que Penn ainda segurava seu braço,
e então percebeu que não queria que ela soltasse.
As
garotas chegaram a sessão de estudos que em geral estava lotada, onde só tinha
uma lâmpada de mesa queimada. Todo mundo devia estar na festa de Gabbe. Todo
mundo exceto Todd. Ele tinha os pés levantados na cadeira em frente a ele e
parecia estar lendo um atlas mundial do tamanho de uma mesa de café. Quando as
garotas caminhavam até ele, ele as olhou com uma expressão que queria dizer que
ou estava muito bem sozinho ou ligeiramente irritado por ter sido perturbado.
— Vocês,
garotas, estão atrasadas — disse categoricamente.
— Assim
como você — replicou Penn, mostrando a língua dramaticamente.
Quando
tinham posto algumas estantes entre elas e Todd, Luce arqueou uma sobrancelha a
Penn.
— O que
foi isso?
— O quê?
Ele paquera comigo.
Ela
cruzou os braços sobre peito e soprou um cacho de seu cabelo marrom dos olhos.
— Como
assim? Você está na quarta série? — Luce
brincou.
Penn
levantou o dedo indicador para Luce com uma intensidade que teria feito Luce
saltar se ela não estivesse rindo muito.
— Você
conhece mais alguém que quer mergulhar na história da família de Justin Bieber com você? Acho que não. Deixe-me em paz.
Até
então, tinham chegado ao canto traseiro da biblioteca, onde todos os 999 livros
se organizavam ao longo de uma única estante de cor metal. Penn se agachou e
traçou a lombada dos livros com seus dedos, Luce sentiu um tremor, como se
alguém percorresse um dedo pelo seu pescoço. Ela esticou a cabeça ao redor e
viu uma nuvem de fumaça cinza. Não negra, como eram as sombras em geral, senão
mais leve, mas fina. Mas igualmente indesejada.
Ela
observou com os olhos arregalados, com a sombra estendida em um longo traço
diretamente sobre a cabeça de Penn. Desceu lentamente, como uma agulha enfiada
e Luce não queria pensar no que poderia acontecer se tocasse em sua amiga. No
outro dia no ginásio tinha sido a primeira vez que a sombra a tinha tocado – e
ela ainda se sentia violada, quase suja. Ela não sabia que outra coisa elas
podiam fazer.
Nervosa,
insegura, Luce esticou o braço como se fosse um bastão de baseball. Deu uma respiração
profunda e lançou para frente. Arrepiou-se ao contato frio enquanto afastava a
sombra – e golpeou o topo da cabeça de Penn.
Penn
pressionou suas mãos contra seu crânio e olhou Luce em choque.
— Qual é
o seu problema?
Luce se
sentou junto a ela e tocou a parte de cima do cabelo de Penn.
— Desculpe.
Havia... pensei que vi uma abelha... pousar em sua cabeça. Me assustei. Não
queria que te picasse.
Ela
podia sentir quão absurdamente, totalmente pobre essa desculpa era e esperou
que sua amiga lhe dissesse que ela estava louca – por que uma abelha estaria em
uma biblioteca? Ela esperou que Penn ficasse furiosa. Mas o rosto redondo de
Penn se suavizou. Ela pegou a mão de Luce entre a sua e as agitou.
— As abelhas
me aterrorizam também — ela contou. — Sou
mortalmente alérgica. Basicamente você salvou a minha vida.
Foi
como se tivessem um grande momento de conexão – só que não era, porque Luce
estava completamente consumida pelas sombras. Se tão somente pudesse afastá-las
de sua mente, afastar as coisas das sombras, sem assustar Penn. Luce tinha um
forte e inquieto pressentimento sobre esta sombra cinza-clara. A uniformidade
das sombras nunca tinham sido reconfortantes, mas estas últimas variações eram
novas em um nível desconcertante.
Significava
que mais tipos de sombras estavam encontrando uma maneira de chegar a ela? Ou
só era ela que estava ficando melhor em distingui-las? E o que era este
estranho momento durante a leitura da Srta. Sophia, quando ela praticamente exortou
uma sombra antes que pudesse entrar em seu bolso? Ela tinha feito isso sem
pensar, e não tinha razão para esperar que seus dois dedos pudessem fazer algo
à sombra, mas eles tinham feito – ela deu uma olhada ao redor das estantes –
pelo menos temporariamente.
Ela se
perguntava se ela tinha arrumado algum tipo de precedente para interagir com as
sombras. Exceto que para chamar o que ela tinha feito com a sombra pairando
sobre a cabeça de Penn de “interagir” – inclusive Luce sabia que era um
eufemismo. Um frio e doentio sentimento cresceu em seu interior quando percebeu
que o que ela tinha começado a fazer com as sombras era mais como... lutar com
elas.
— Essa é
a coisa mais estranha — Penn falou do chão. — Deveria
ser exatamente aqui entre O Dicionário dos Anjos e esta
coisa horrível de Billy Graham fogo-e-enxofre.
— Ela levantou a vista para Luce. — Mas
sumiu.
— Pensei
que você tivesse dito...
— Eu
disse. O computador tinha listado as estantes quando procurei esta tarde, mas
não podemos conectar a esta hora para checar de novo.
— Pode
perguntar à Todd — Luce sugeriu. — Talvez
ele esteja usando como capa para suas Playboys.
— Que
nojento — Penn bateu em sua coxa.
Luce
saiba que só tinha feito essa brincadeira para baixar um pouco sua decepção.
Isso era tão frustrante. Ela não podia encontrar nada sobre Justin sem correr
contra uma parede. Ela não sabia o que poderia encontrar nessas páginas do
livro de sua tatara-tatara-o que seja do livro, mas pelo menos lhe diria algo
mais sobre Justin. No qual era melhor que nada.
— Fique
aqui — disse Penn, levantando-se. — Vou
perguntar para a Srta. Sophia se alguém o tirou hoje.
Luce a
observou ir sobre o longo corredor até a mesa da frente. Ela riu quando Penn
apertou o passo quando passou pela área onde Todd estava sentado.
Sozinha
no canto de trás, Luce roçou alguns dos outros livros na estante. Ela fez uma
rápida e mental revisão de todos os estudantes na Sword & Cross, mas não
podia pensar em nenhum candidato para tirar um velho livro de religião. Talvez
a Srta. Sophia tinha usado como referência para sua sessão de revisão mais
cedo.
Luce se
perguntou o que deve ter sido para Justin ficar sentado lá, escutando a
bibliotecária falar sobre coisas que tinham sido provavelmente temas da mesa de
jantar em sua casa quando ele estava crescendo. Luce queria saber como tinha
sido a infância dele. O que tinha acontecido a sua família? Teve sua educação
em um orfanato religioso? Ou tinha sido sua infância como a dela, onde as
únicas coisas perseguidas religiosamente eram boas notas e honras acadêmicas? Ela
queria saber se Justin tinha lido este livro escrito por seu ancestral e o que
ele tinha pensado sobre isso, e se ele gostava de escrever.
Ela
queria saber o que ele estava fazendo exatamente agora na festa de Gabbe e
quando era seu aniversário e qual o tamanho do sapato que usava e se ele alguma
vez desperdiçou um segundo de seu tempo pensando nela.
Luce
sacudiu sua cabeça. Este tipo de pensamento estava dirigindo-se diretamente a
Cidade da Piedade, e ela queria sair. Tirou o primeiro livro da estante – a tão
desinteressante surrada capa do Dicionário
dos Anjos – e decidiu se distrair lendo até que Penn voltasse.
Ela
tinha ido até o ponto quando o anjo caído Abbadon, que se arrependeu de estar
do lado de Satanás e constantemente lamentava sua má decisão – bocejo – quando
um som forte soou sobre sua cabeça. Luce olhou para cima para ver a luz
vermelha do alarme de incêndio.
— Alerta. Alerta — uma
monótona voz robótica anunciava em voz alta. — O alarme de incêndio foi ativado. Evacuem o prédio.
Luce deslizou
o livro de volta para a estante e começou a correr. Eles tinham feito este tipo
de coisa em Dover o tempo todo. Depois de um tempo, tinha chegado ao ponto onde
nem mesmo os professores ouviam as simulações de incêndios mensalmente, então o
Departamento de Bombeiros tinha realmente começado a configurar o alarme só
para as pessoas responderem.
Luce
podia ver claramente os administradores da Sword & Cross fazendo a mesma
coisa. Mas quando ela começou a caminhar até a saída, foi surpreendida ao
encontrar-se tossindo. Tinha fogo de verdade na biblioteca.
— Penn? — Ela
gritou, escutando o eco de sua voz em seus ouvidos.
Ela
sabia que seria abafada pelo ruído do alarme. O odor da fumaça a fez instantaneamente
voltar às chamas na noite com Trevor. Imagens e sons flutuavam em sua cabeça,
coisas que ela tinha abafado tão profundamente de sua memória que poderiam
muito bem ter sido apagadas. Até agora.
Os
surpreendentes olhos brancos de Trevor contra a luz alaranjada. As individuais
chamas enquanto o fogo se dispersava entre cada um de seus dedos. O agudo e
interminável grito que ressoava em sua cabeça como uma sirene muito depois que
Trevor tivesse dado por vencido. E todo o tempo, ela tinha estado ali parada,
observando, ela não podia deixar de ver, congelada neste banho de calor. Ela
não tinha sido capaz de mover-se. Ela não tinha sido capaz de fazer algo para
ajudá-lo. Então ele morreu.
Sentiu alguém
agarrar seu pulso esquerdo e se virou, esperando ver Penn. Era Todd. O branco
de seus olhos eram enormes, e ele estava tossindo também.
— Temos
que sair daqui — ele disse, respirando rápido. — Acho
que a saída está na parte de trás.
— E Penn
e a Srta. Sophia? — Luce perguntou.
Ela
estava se sentindo fraca e enjoada. Esfregou os olhos.
— Elas
estavam ali.
Quando
ela apontou para o corredor até a entrada, ela podia ver o quanto a fumaça
tinha se tornado mais grossa nesta direção.
Todd
olhou receoso por um segundo, mas depois assentiu.
— Ok — ele
disse, mantendo-se agarrado ao pulso dela enquanto se agachavam e corriam até
as portas principais da biblioteca.
Foram
para a direita quando um corredor parecia particularmente estar cheio de
fumaça, encontraram-se em uma parede de livros sem nenhuma pista de até onde
correr. Os dois pararam para respirar.
A
fumaça que só a alguns momentos estava sobre suas cabeças, agora pressionava
abaixo de seus ombros. Ainda agachados nela, eles estavam se asfixiando. E não
podiam ver nada mais que alguns metros à frente deles. Certificando-se de se
manter agarrada a Todd, Luce deu uma volta em círculo, repentinamente insegura
de qual direção eles tinham vindo. Ela estendeu a mão e sentiu um metal quente
de uma estante. Ela nem sequer podia ver os títulos nos livros. Estavam na sessão
de D ou O?
Não
tinham pista que guiasse até Penn e a Srta. Sophia, e nenhuma pista que os
guiassem para a saída tampouco. Luce sentiu uma onda de pânico passar por ela,
fazendo mais difícil respirar,
— Elas já
devem ter saído pelas portas da frente! — Todd
gritou, parecendo meio convencido. — Temos
que voltar!
Luce
mordeu seu lábio. E se alguma coisa aconteceu com Penn? Ela mal podia ver Todd,
que estava parado exatamente em frente a ela. Ele tinha razão, mas qual era o
caminho de volta?
Luce
assentiu silenciosamente, e sentiu a mão dele tomando a dela.
Por um longo
tempo, ela se moveu sem saber onde estavam indo, mas enquanto eles seguiam, a fumaça
se desvanecia, pouco a pouco, até que, eventualmente, ela viu o brilho vermelho
da saída de emergência. Luce deu um suspiro de alívio enquanto Todd procurava
pela maçaneta da porta e finalmente a abriu.
Eles
estavam em um corredor que Luce jamais tinha visto. Todd fechou a porta atrás
deles. Eles tossiram e encheram seus pulmões com ar limpo. Tinha um gosto tão
bom, Luce queria afundar seus dentes nisso, beber um galão disso, banhar-se
nisso.
Ela e
Todd tossiram a fumaça para fora de seus pulmões até que começaram a rir, uma
inquieta, quase aliviada risada. Eles riram até que ela estava chorando. Mas
mesmo quando Luce terminou de chorar e tossir, seus olhos continuavam
lacrimejando. Como podia respirar neste ar quando ela nem sequer sabia o que
tinha acontecido a Penn? E se Penn não tinha conseguido sair – se estava presa
em algum lugar lá dentro – então Luce tinha falhado com alguém a quem lhe importava
novamente. Só que desta vez seria muito pior.
Ela
limpou os olhos e viu uma nuvem de fumaça passando por baixo da rachadura da
base da porta. Ainda não estavam a salvo. Tinha outra porta no final do
corredor. Através do painel de cristal da porta, Luce podia ver a forma de um
ramo de uma árvore na noite. Exalou. Em pouco tempo, estariam do lado de fora,
longe dessa fumaça intoxicante.
Se
fossem o suficiente rápido, podiam ir para a entrada principal e assegurar-se
de que Penn e a Srta. Sophia tinham saído.
— Vamos — Luce falou
a Todd, que estava curvado, respirando com dificuldade. — Temos
que continuar.
Ele se
endireitou, mas Luce podia ver que estava realmente mal. Seu rosto estava
vermelho, seus olhos eram selvagens e molhados. Ela praticamente teve que
arrastá-lo até a porta. Ela estava tão concentrada em sair dali que levou um
tempo para processar o pesado ruído que tinha caído sobre eles, silenciando o
alarme.
Ela
olhou para o redemoinho de sombras. Um espectro de sombras de tons de cinza e o
mais profundo negro. Ela só devia ser capaz de ver um pouco mais sobre o teto,
mas as sombras pareciam de alguma maneira estender-se sobre os limites, em um
estranho e escondido céu. Todas estavam amontoadas umas sobre as outras, mas
ainda assim, de alguma maneira eram distintas.
No meio
delas estava a sombra mais clara e cinza que ela tinha visto anteriormente. Não
era mais da forma alongada de uma agulha, mas agora parecia quase como a chama
de um fósforo. Se balançou até eles no corredor. Ela realmente tinha apartado
essa forma obscura quando tinha ameaçado esfolar a cabeça de Penn? A recordação
fez com que suas palmas lhe coçassem e seus dedos se enrolarem.
Todd
começou a bater-se contra as paredes, como se o corredor estivesse
aproximando-se dele. Luce sabia que eles estavam em algum lugar próximos da
porta. Ela pegou sua mão, mas suas mãos suadas se deslizaram uma e outra vez.
Ela enrolou seus dedos fortemente ao redor do pulso dele. Ele estava tão pálido
como um fantasma, agachou-se do chão, quase encolhido. Um gemido de pavor
escapou de seus lábios.
Era
porque a fumaça agora estava chegando no corredor? Ou era porque ele também
podia ver as sombras? Impossível.
Ainda
assim, seu rosto estava comprimido e horrorizado. Muito mais agora que as
sombras estavam aproximando-se.
— Luce? — Sua
voz tremeu.
Outra
onda de sombras se levantou diretamente em seu caminho. Uma cortina negra
intensa se estendeu sobre as paredes e fez impossível para Luce ver o chão. Ela
olhou para Todd – ele podia ver isso?
— Corre! — Ela
gritou.
Ele
ainda podia correr? Seu rosto estava cinzento e suas pálpebras fechadas. Ele
estava a ponto de desmaiar. Mas então, repentinamente parecia como se ele estivesse
carregando-a. Ou algo estava carregando os dois.
— Que
diabos...? — Todd gritou.
Seus
pés se levantaram do chão só por um momento. Sentiu como se estivesse em uma
onda no oceano, um cume leve que a levantava mais alto, levando seu corpo ao
ar. Luce não sabia até onde iria – ela nem sequer podia ver a porta, só um monte
de sombras ao redor. Próximas dela, mas não a tocaram. Ela deveria ter estado
horrorizada, mas não estava. De alguma maneira se sentia protegida das sombras,
como se algo a estivesse protegendo – algo flexível mas impenetrável. Algo
estranhamente familiar. Algo forte, mas gentil. Algo... quase muito rápido, ela
e Todd estavam na porta. Seus pés tocaram o chão de novo, e ela se lançou
contra porta de emergência.
Então
ela soltou. Sufocada. Ofegante. Com ânsia de vômito.
Outro
alarme estava soando. Mas estava soando muito longe.
O vento
roçou seu pescoço. Eles estavam do lado de fora! Parados em um pequeno
peitoral, um lance de escadas chegavam até a área principal, e inclusive quando
tudo em sua cabeça se sentia nublado e cheio de fumaça, Luce pensou que podia
escutar vozes em algum lugar próximo. Ela virou para tentar saber o que tinha
acontecido. Como ela e Todd tinham saído através dessa grossa, negra e
impenetrável sombra? E o que era essa coisa que os tinha salvo? Luce sentiu sua
ausência. Ela quase queria voltar para procurá-la. Mas o corredor estava
escuro, e seus olhos ainda estavam cheios de lágrimas, e ela já não podia distinguir
as retorcidas formas das sombras. Talvez tivessem ido.
Depois
houve uma irregular pincelada de luz, algo que parecia com o tronco de árvore
com ramos – não, como um torço amplos, longos membros. Uma pulsante, quase
violeta coluna de luz movendo-se pra cima deles. Isso fez com que Luce
pensasse, absurdamente, em Justin. Ela estava vendo coisas. Ela respirou fundo
e tentou piscar as lágrimas de fumaça de seus olhos. Mas a luz ainda estava
ali. Ela sentia mais que ouvi-la chamar, acalmando-a, uma canção de ninar em meio
a uma zona de guerra.
Então
ela não viu chegar a sombra.
Bateu
no corpo dela e de Todd, rompendo a ligação um do outro, e lançando Luce no ar.
Ela aterrissou ao pé das escadas. Um grunhido agonizante escapou de seus
lábios. Por um longo momento sua cabeça latejava. Ela nunca tinha conhecido uma
dor tão profunda e abrasadora como esta. Ela chorou durante a noite, no
conflito de luz e sombra sobre sua cabeça. Então tudo se tornou muito e Luce se
entregou, fechando os olhos.Continua...