![https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg-zsA-8n4hPfVA1i-Bawwq9kcaVbz-i8F__S5Tlukh82Ify5eW_0H0BM7VhTeNVYsA9LbkLTWvSEaJFEuecTByPrYY8Az8nHlDSipYdjhR5vlP24vD6B886HaQAowQUoCZQeT2ZhRF9Ds/s400/C%C3%B3pia+de+anjo.jpg](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg-zsA-8n4hPfVA1i-Bawwq9kcaVbz-i8F__S5Tlukh82Ify5eW_0H0BM7VhTeNVYsA9LbkLTWvSEaJFEuecTByPrYY8Az8nHlDSipYdjhR5vlP24vD6B886HaQAowQUoCZQeT2ZhRF9Ds/s400/C%C3%B3pia+de+anjo.jpg)
— Está
com medo? — Justin perguntou.
Sua
cabeça estava inclinada para o lado, seu cabelo dourado desgrenhado por uma brisa
suave. Ele estava segurando-a, e enquanto seu aperto estava firme em torno de
sua cintura, era tão suave e leve como um lenço de seda. Seus próprios dedos
estavam entrelaçados atrás do pescoço sem camisa dele.
Ela
estava com medo? Claro que não. Ela estava com Justin. Finalmente. Em seus
braços. A verdadeira questão incomodando nos fundos de sua mente era: Deveria
ficar com medo? Ela não podia ter certeza. Nem mesmo sabia onde estava.
Ela
conseguia sentir o cheiro de chuva no ar, próxima. Mas tanto ela quanto Justin
estavam secos. Ela conseguia sentir um longo vestido branco fluindo até seus
tornozelos. Havia só um pouco de luz do dia restante. Luce sentiu um
arrependimento penetrante ao desperdiçar o pôr-do-sol, como se houvesse algo
que ela pudesse fazer para detê-lo. De alguma forma, ela sabia que esses raios
de luz finais eram tão preciosos quanto as últimas gotas de mel em um jarro.
— Você
fica comigo? — ela perguntou.
Sua voz
era o mais fino sussurro, quase cancelado por um gemido baixo de trovão. Uma
rajada de vento girou ao redor deles, soprando o cabelo de Luce em seus olhos. Justin cruzou seus braços com mais força ao redor dela, até que ela conseguisse
respirar a respiração dele, pudesse sentir o cheiro da pele dele na dela.
— Para
sempre — ele sussurrou de volta.
O som
doce de sua voz a completou.
Havia
um pequeno arranhão do lado esquerdo da testa dele, mas ela esqueceu dele
enquanto Justin pegou suas bochechas entre as mãos e trouxe seu rosto mais para
perto. Ela inclinou sua cabeça para trás e sentiu todo o seu corpo ficar frouxo
de expectativa.
Finalmente,
finalmente, os lábios dele desceram nos dela com uma urgência que tirou seu
fôlego. Ele a beijou como se ela pertencesse a ele, tão naturalmente como se
ela fosse alguma parte dele há muito tempo perdida que ele pudesse enfiar
recuperar.
Então a
chuva começou a cair. Ensopou seus cabelos, correu pelos seus rostos e suas
bocas. A chuva estava quente e inebriante, como os próprios beijos.
Luce
esticou sua mão ao redor das costas dele para puxá-lo mais para perto, e suas
mãos deslizavam em algo aveludado. Ela correu uma mão sobre isso, depois outra,
buscando seus limites, e então olhou para além do rosto brilhante de Justin. Algo
estava se desenrolando atrás dele.
Asas.
Lustrosas e iridescentes, batendo devagar, sem esforço, brilhando na chuva. Ela
as tinha visto antes, talvez, ou algo parecido com elas, em algum lugar.
— Justin — ela
falou, arfando.
As asas
consumiram sua visão e sua mente. Elas pareciam girar em um milhão de cores, fazendo
sua cabeça doer. Luce tentou olhar para outro lugar, para qualquer outro lugar,
mas de todos os lados, tudo que ela podia ver além de Justin eram os rosas e
azuis infinitos do céu se pondo. Até que ela olhou para baixo e observou uma
última coisa. O chão. Milhares de metros abaixo deles.
***
Quando
ela abriu seus olhos, estava muito claro, sua pele muito seca, e havia uma dor imobilizante
na parte de trás de sua cabeça. O céu tinha ido embora, assim como Justin. Outro
sonho.
Só que
esse a deixou se sentindo quase doente de desejo.
Ela
estava em um quarto de paredes brancas. Deitada em uma cama de hospital. À sua
esquerda, uma cortina fina como papel tinha sido arrastada pela metade do
quarto, separando-a de algo se movimentando no outro lado.
Luce delicadamente
tocou o ponto tenro na base do seu pescoço e choramingou. Ela tentou se
orientar. Não sabia onde estava, mas tinha uma nítida sensação de que não estava
mais na Sword & Cross. Seu vestido branco largo era – ela deu um tapinha
nas laterais – uma folgada camisola de hospital. Ela conseguia sentir cada
parte do sonho escapulindo – tudo exceto aquelas asas. Elas tinham sido tão
reais. O toque delas tão aveludado e fluído. Seu estômago agitou-se. Ela fechou
e abriu seus punhos, hiperconsciente de seu vazio.
Alguém
agarrou e apertou sua mão direita. Luce virou sua cabeça rapidamente e recuou.
Ela tinha assumido que estava sozinha. Gabbe estava empoleirada na beira de uma
cadeira giratória azul desbotada que parecia, irritantemente, realçar a cor dos
olhos.
Luce
queria se desvencilhar – ou pelo menos, ela esperou querer se desvencilhar –
mas então Gabbe lançou-lhe o sorriso mais quente, um que fez Luce se sentir, de
alguma forma, segura, e ela percebeu que estava feliz por não estar sozinha.
— Quanto
disso foi um sonho? — ela murmurou.
Gabbe
riu. Ela tinha um pote de creme para cutículas na mesa ao lado dela, e começou
a esfregar o negócio branco com aroma de limão nas unhas de Luce.
— Isso
tudo depende — ela respondeu, massageando os dedos de Luce. — Mas não
se importe com sonhos. Eu sei que sempre quando sinto o meu mundo virando de
cabeça para baixo, nada me acalma como uma manicure.
Luce
olhou para baixo. Ela nunca fora muito de esmalte, mas as palavras de Gabbe a
lembraram de sua mãe, que sempre sugeria que elas fossem à manicure quando Luce
tinha um dia ruim.
Enquanto
as mãos lentas de Gabbe trabalhavam em seus dedos, Luce se perguntava se todos esses
anos ela estivera perdendo isso.
— Onde
nós estamos? — ela perguntou.
— Hospital
Lullwater.
Sua
primeira viagem para fora do campus e ela acabara em um hospital a cinco
minutos da casa dos seus pais. Na última vez em que ela estivera aqui fora para
tirar três pontos de seu cotovelo quando ela caíra da sua bicicleta. Seu pai
não havia deixado o seu lado. Agora ele não estava em lugar algum.
— Há
quanto tempo estou aqui?
Gabbe
olhou para o relógio branco na parede e disse:
— Eles te
acharam desmaiada devido a inalação de fumaça na noite passada por volta das
onze. É procedimento operacional padrão chamar o Técnico de Emergência Médica
quando encontram alguém do reformatório inconsciente, mas não se preocupe,
Randy disse que vão te deixar sair daqui logo logo. Assim que seus pais
assentirem...
— Meus
pais estão aqui?
— E
cheios de preocupação com a filha deles, até as pontas do cabelo com permanente
da sua mamãe. Eles estão no corredor, se afogando em papelada. Eu disse a eles
que ficaria de olho em você.
Luce
resmungou e apertou seu rosto no travesseiro, convocando a profunda dor na
parte de trás de sua cabeça novamente.
— Se você
não quiser vê-los...
Mas
Luce não resmungava por causa de seus pais. Ela estava morrendo de vontade de
ver seus pais. Ela estava se lembrando da biblioteca, do fogo, e da nova
geração de sombras que ficava mais assustadora cada vez que a encontravam. Elas
sempre foram escuras e feias, elas sempre a fizeram se sentir nervosa, mas
ontem à noite, tinha quase parecido como se as sombras quisessem algo dela. E
então houve aquela outra coisa, a força levitante que a libertou.
— Que
cara é essa? — Gabbe perguntou, inclinando sua cabeça e acenando sua mão no ar
na frente do rosto de Luce. — No que está pensando?
Luce
não sabia como assimilar a bondade repentina de Gabbe com ela. Assistente de
enfermeira não parecia exatamente o tipo de emprego em que Gabbe seria
voluntária, e não era como se houvesse algum cara por aqui cuja atenção ela
pudesse monopolizar. Gabbe nem mesmo parecia gostar de Luce. Ela não apareceria
aqui por vontade própria, apareceria?
Mas
mesmo tão bondosa quanto Gabbe estava sendo, não havia jeito de explicar o que
tinha acontecido na noite passada. A reunião pavorosa e inexprimível no
corredor. A sensação surreal de ser impulsionada para frente por aquela
escuridão. A figura estranha e atraente da luz.
— Onde o
Todd está? — Luce perguntou, lembrando-se dos olhos amedrontados do rapaz.
Ela perdera
seu aperto sobre ele, saiu voando, e então...
A
cortina de papel foi repentinamente atirada para trás, e ali estava Ariane,
usando patins em linha e um uniforme vermelho-e-branco cor de doce listrado.
Seu curto cabelo preto estava retorcido em uma série de nós no alto da sua
cabeça. Ela rolou, carregando uma bandeja na qual estavam três cocos verdes com
canudos de festa em formato de guarda-chuva de cor neon.
— Agora
me deixa entender — ela disse numa voz rouca,
nasal. — Ponha o canudo no coco e beba ambos... opa, caras azedas. O que
estou interrompendo?
Ariane
parou as rodas no pé da cama de Luce. Ela estendeu uma batida de coco com um
guarda-chuva rosa balançando.
Gabbe
pulou e agarrou o copo primeiro, dando uma cheirada em seu conteúdo.
— Ariane,
ela acabou de passar por um trauma — ela
repreendeu. — E para sua informação, o que você interrompeu foi o assunto Todd.
Ariane
jogou seus ombros para trás.
— Justamente
o por que dela precisar de algo potente — ela debateu,
segurando a bandeja possessivamente enquanto ela e Gabbe envolviam-se em um concurso
de encarar.
— Ótimo — Ariane
disse, olhando para longe de Gabbe. — Darei a
ela sua velha bebida chata.
Ela deu
a Luce o copo com o canudo azul.
Luce
devia estar em algum tipo de atordoamento pós-traumático. Onde é que elas
poderiam ter conseguido esse negócio? Batida de coco com guarda-chuvinhas
coloridos? Era como se ela tivesse adormecido no reformatório e acordado em um
hotel cinco estrelas.
— Onde
vocês conseguiram todas essas coisas? — ela
perguntou. — Quero dizer, obrigada, mas...
— Nós
unimos nossos recursos quando precisamos — Ariane
respondeu. — Roland ajudou.
As três
se sentaram bebendo de forma barulhenta as bebidas geladas e doces por um
momento, até que Luce não conseguisse aguentar mais.
— Então,
voltando para o Todd...?
— Todd — Gabbe repetiu,
limpando sua garganta. — O negócio é que... ele
simplesmente inalou muito mais fumaça do que você, doçura...
— Ele não
inalou — Ariane cuspiu. — Ele quebrou o pescoço.
Luce
arfou, e Gabbe bateu em Ariane com sua bebida de guarda-chuva.
— O quê? — Ariane
indagou. — Luce pode aguentar isso. Se ela vai descobrir eventualmente, por
que adoçar a verdade?
— A
evidência ainda é inconclusiva — Gabbe disse, sublinhando as
palavras.
Ariane
deu de ombros.
— Luce
estava lá, ela deve ter visto...
— Eu não
vi o que aconteceu com ele. Nós estávamos juntos e então, de alguma forma,
fomos separados. Eu tive um mau pressentimento, mas eu não sabia... — ela
sussurrou. — Então ele...
— Se foi
desse mundo — Gabbe disse suavemente.
Luce
fechou seus olhos. Um frio, que não tinha nada a ver com a bebida, se espalhou
por ela. Ela se lembrou do Todd batendo freneticamente nas paredes, sua mão
suada apertando a dela quando as sombras rugiram sobre eles, o momento terrível
quando os dois foram separados e ela ficara muito chocada para ir até ele.
Ele
tinha visto as sombras. Luce estava certa disso agora. E ele morrera.
Depois
de Trevor ter morrido, nenhuma semana se passou sem uma carta de ódio
encontrando seu caminho até Luce. Seus pais começaram a tentar vetar o correio
antes que ela pudesse ler as coisas venenosas, mas muito ainda chegava a ela.
Algumas cartas eram escritas à mão, algumas eram digitadas, uma tinha até sido
cortada de letras de revistas, estilo bilhete de resgate.
Assassina,
bruxa. Eles a tinham chamado de nomes cruéis o bastante para encher uma página
de recados, causado agonia o bastante para mantê-la trancada dentro de casa
durante todo o verão.
Ela
pensara que tinha feito tanto para se afastar daquele pesadelo: deixando seu
passado para trás quando ela foi para a Sword & Cross, concentrando-se em
suas aulas, fazendo amigos... ah Deus.
Ela inspirou
profundamente.
— E
quanto a Penn? — ela perguntou, mordendo seu lábio.
— Penn
está ótima — Ariane disse. — Ela é totalmente matéria de
primeira página, testemunha do incêndio. Tanto ela quanto a Senhorita Sophia
saíram, cheirando como um poço de fumaça do leste da Geórgia, mas ainda assim bem.
Luce
soltou sua respiração. Pelo menos havia uma boa notícia. Mas sob os lençóis
finos como papel fino da enfermaria, ela estava tremendo. Logo, certamente os
mesmos tipos de pessoas que foram atrás dela após a morte de Trevor iriam atrás
dela novamente. Não apenas os que escreveram as cartas zangadas. Dr. Sanford.
Seu agente da condicional. A polícia.
Bem
como antes, seria esperado que ela tivesse a história toda reunida. Que
lembrasse de cada detalhe mínimo. Mas é claro que, exatamente como antes, ela
não seria capaz. Numa hora, ele estivera ao seu lado, apenas os dois. Na
seguinte...
— Luce!
Penn
irrompeu pela sala, segurando um grande balão de hélio marrom. Tinha a forma de
um band-aid e dizia Arranca em letras
cursivas azuis.
— O que é
isso? — ela perguntou, olhando para as outras três garotas criticamente. — Algum
tipo de festa do pijama?
Ariane
tinha desamarrado seus patins e subido na minúscula cama ao lado de Luce. Ela
estava segurando os dois copos e deitando sua cabeça no ombro de Luce. Gabbe
estava pintando esmalte transparente na mão livre de Luce.
— É — Ariane
gargalhou. — Junte-se a nós, Penny. Estávamos prestes a jogar Verdade ou Desafio.
Deixaremos você ir primeiro.
Gabbe
tentou encobrir sua risada com um delicado espirro falso. Penn colocou suas
mãos nos quadris. Luce se sentiu mal por ela, e também um pouco assustada. Penn
pareceu bastante feroz.
— Um dos
nossos colegas morreu na noite passada — Penn
enunciou cuidadosamente. — E Luce poderia ter se machucado
muito. — Ela balançou sua cabeça. — Como
vocês podem brincar numa hora como essa? — ela
fungou. — Isso é álcool?
— Ohhh — Ariane
disse, olhando para Penn, seu rosto sério. — Você
gostava dele, não gostava?
Penn
pegou um travesseiro da cadeira atrás dela e jogou-o em Ariane. O negócio era
que Penn estava certa. Era estranho que Ariane e Gabbe estivessem tomando a
morte de Todd como algo quase leve. Como se elas vissem esse tipo de coisa
acontecer o tempo todo. Como se isso não as afetasse da forma como afetava
Luce. Mas elas não podiam saber o que Luce sabia sobre os últimos momentos de
Todd. Elas não poderiam saber por que ela se sentia tão enojada agora. Ela deu
um tapinha no pé da cama para Penn e entregou-lhe o que restava de sua bebida.
— Nós
saímos pelos fundos, e então... — Luce
não conseguia nem mesmo dizer as palavras. — O que
aconteceu com você e a Senhorita Sophia?
Penn
olhou desconfiadamente para Ariane e Gabbe, mas nenhuma se movimentou para ser insolente.
Penn desistiu e se sentou na beirada da cama.
— Eu
simplesmente fui lá perguntar a ela sobre... — Ela
olhou para as outras duas garotas novamente, então lançou a Luce um olhar
astucioso. — A pergunta que eu tinha. Ela não sabia a resposta, mas queria me
mostrar outro livro.
Luce
tinha esquecido tudo sobre a busca dela e de Penn na noite passada. Isso
parecia tão distante e tão irrelevante depois do que havia acontecido.
— Nós nos
afastamos dois passos da mesa da Senhorita Sophia — Penn
continuou — e houve essa explosão maciça de luz de canto de olho. Quero dizer,
li sobre combustão espontânea, mas isso foi...
Todas
as três outras garotas estavam se inclinando para a frente nesse momento. A
história de Penn era notícia de primeira página.
— Algo
deve ter começado isso — Luce falou, tentando imaginar
a mesa da Senhorita Sophia em sua mente. — Mas eu
não acho que havia mais alguém na biblioteca.
Penn
sacudiu a cabeça.
— Não
havia. A Senhorita Sophia disse que um fio deve ter dado curto-circuito em uma
lâmpada. O que quer que tenha acontecido, o fogo tinha bastante combustível.
Todos os documentos dela se foram rapidamente.
Ela
estalou os dedos.
— Mas ela
está bem? — Luce perguntou, dedilhando a bainha parecida com papel de sua
camisola de hospital.
— Perturbada,
mas bem. Os extintores de incêndio foram ligados eventualmente, mas acho que
ela perdeu um bando das coisas dela. Quando lhe contaram o que aconteceu com o
Todd, foi quase como se ela estivesse dormente demais até mesmo para entender.
— Talvez
estejamos todos dormentes demais para entender — Luce concordou.
Dessa vez Gabbe e Ariane assentiram de cada lado dela. — Os...
os pais do Todd sabem? — ela perguntou, querendo saber
como diabos ela explicaria para seus próprios pais o que tinha acontecido.
Ela os
imaginou preenchendo papelada no salão. Será que eles iriam querer vê-la? Será
que eles conectariam a morte do Todd com a de Trevor... e traçariam ambas as
histórias terríveis até ela?
— Eu ouvi
Randy no telefone com os pais de Todd — Penn
disse. — Eu acho que eles vão processar. O corpo dele está sendo mandado de
volta para a Flórida mais tarde hoje.
Só isso? Luce engoliu em seco.
— A Sword
& Cross vai fazer um serviço memorial para ele na quinta — Gabbe murmurou.
— Justin e eu vamos ajudar a organizar.
— Justin?
— Luce repetiu antes que pudesse se controlar.
Ela
olhou para Gabbe, e mesmo em seu estado abatido pelo luto, ela não conseguiu
evitar reverter à sua imagem inicial da garota: uma sedutora loira de lábios
rosa.
— Foi ele
quem achou vocês dois na noite passada — Gabbe explicou.
— Ele carregou você da biblioteca até o escritório da Randy.
Justin a
tinha carregado? Tipo... seus braços em volta do corpo dela? O sonho voltou
correndo e a sensação de voar – não, de flutuar – a inundou. Ela se sentiu
amarrada demais em sua cama. Ela sentia falta do mesmo céu, da chuva, da boca
dele, dos dentes dele, da língua dele fundindo com a dela novamente. Seu rosto
ficou quente, primeiro com desejo, então com a impossibilidade agonizante de
tudo aquilo acontecer enquanto ela estivesse acordada. Aquelas asas gloriosas e
cegantes não eram as únicas coisas fantásticas nesse sonho. O Justin da vida real
somente a carregara para a enfermaria. Ele nunca iria querer ela, nunca a
pegaria em seus braços, não desse jeito.
— Hã,
Luce, você está bem? — Penn perguntou.
Ela
estava abanando as bochechas coradas de Luce com sua bebida de guarda-chuva.
— Ótima.
Era
impossível afastar aquelas asas de sua mente. Esquecer da sensação do rosto
dele sobre o dela.
— Ainda
estou me recuperando, suponho.
Gabbe
deu um tapinha em sua mão.
— Quando
ficamos sabendo sobre o que tinha acontecido, nós bajulamos a Randy para nos
deixar vir visitar — ela disse, revirando seus
olhos. — Não queríamos que você acordasse sozinha.
Houve
uma batida na porta. Luce esperava ver os rostos ansiosos de seus pais, mas
ninguém entrou. Gabbe ficou de pé e olhou para Ariane, que não fez menção
alguma de se levantar.
— Fiquem
aqui. Eu lidarei com isso.
Luce
ainda estava sobrepujada pelo que tinham lhe contado sobre Justin. Mesmo não
fazendo sentido algum, ela queria que fosse ele fora daquela porta.
— Como
ela está? — uma voz perguntou em um sussurro. Mas Luce a ouviu. Era ele.
Gabbe murmurou
algo de volta.
— Que
congregação toda é essa? — Randy rosnou do lado de fora
da sala.
Luce
sabia, com o coração afundado, que isso significava que as horas de visita tinham
acabado.
— Quem
quer que tenha me convencido a deixar vocês, seus pestinhas, virem junto recebe
detenção. E não, Bieber, não aceitarei flores como suborno. Todos vocês,
entrem na minivan.
Ouvindo
a voz da mulher, Ariane e Penn se encolheram, então correram para esconder os
copos debaixo da cama. Penn enfiou os guarda-chuvas da bebida dentro de seu
estojo e Ariane espirrou um forte perfume almíscar de baunilha no ar. Ela deu
um pedaço de chiclete de hortelã para Luce.
Penn
engasgou numa nuvem flutuante de perfume, então se inclinou rapidamente para
Luce e sussurrou:
— Assim
que estiver boa de nova, acharemos o livro. Acho que será bom para nós duas ficarmos
ocupadas, tirar nossas mentes das coisas.
Luce
apertou a mão de Penn em agradecimento e sorriu para Ariane, que parecia
ocupada demais amarrando o cadarço de seus patins para ter ouvido.
Foi
então que Randy empurrou com tudo a porta.
— Mais
congregação! — ela gritou. — Inacreditável.
— Nós
estávamos apenas... — Penn começou a dizer.
— Indo
embora — Randy terminou por ela.
Ela
tinha um buquê de peônias brancas selvagens em sua mão.
Estranho.
Elas eram as favoritas de Luce. E era tão difícil achá-las florescendo por aqui.
Randy abriu um armário debaixo da pia e fuçou por um minuto, então puxou um
vaso pequeno e empoeirado. Ela o encheu com a água turva da torneira, colocou
as peônias rudemente dentro, e as assentou na mesa ao lado de Luce.
— São dos
seus amigos que irão todos se despedir agora.
A porta
estava largamente aberta, e Luce conseguia ver Justin encostado contra a
moldura. Seu queixo estava levantado e seus olhos cor de mel estavam nublados
com preocupação. Ele encontrou o olhar de Luce e deu-lhe um pequeno sorriso.
Quando ele tirou seus cabelos de perto de seus olhos, Luce conseguiu ver um
pequeno corte vermelho escuro em sua testa.
Randy
dirigiu Penn, Ariane e Gabbe porta afora. Mas Luce não conseguia tirar seus
olhos de Justin. Ele ergueu uma mão no ar e balbuciou o que ela achava ser Sinto muito, logo antes de Randy empurrá-los
para fora.
— Espero
que eles não tenham te deixado exausta — Randy
disse, espreitando na entrada com um franzir de testa antipático.
— Ah não!
Luce
sacudiu sua cabeça, percebendo o quanto ela tinha aprendido a contar com a lealdade
de Penn, e a maneira peculiar de Ariane animar até mesmo o humor mais sombrio. Gabbe,
também, tinha sido realmente bondosa com ela. E Justin, embora ela mal o tenha
visto, tinha feito mais para restaurar sua paz de espírito do que jamais
saberia. Ele tinha vindo para checá-la. Ele estivera pensando nela.
— Bom — Randy
disse. — Porque o horário da visita ainda não acabou.
Novamente,
o coração de Luce acelerou enquanto ela esperava ver seus pais. Mas houve
apenas um ligeiro ruído no chão de linóleo, e logo Luce viu a minúscula moldura
da Senhorita Sophia.
Um xale
de outono colorido estava sobre seus ombros magros, e seus lábios estavam
pintados de um vermelho profundo para combinar. Atrás dela andava um homem
baixo e careca de terno e dois policiais, um gordinho e um magro, ambos com
linhas capilares retrocedendo e braços cruzados.
O
policial gordinho era mais jovem. Ele sentou-se na cadeira ao lado de Luce,
então – percebendo que ninguém mais tinha se mexido para sentar – levantou-se
novamente recruzou os braços.
O
careca deu um passo a frente e ofereceu sua mão à Luce.
— Sou o
Mr. Schultz, advogado da Sword & Cross — Luce
apertou sua mão duramente. — Esses policiais simplesmente
vão te fazer algumas perguntas. Nada a ser usado em um tribunal, apenas um
esforço para corroborar os detalhes do acidente...
— E eu
insisti em estar aqui durante o questionamento, Lucinda — a
Senhorita Sophia acrescentou, indo para a frente para acariciar o cabelo de
Luce. — Como está, querida? — ela sussurrou.
— Em estado amnéstico de choque?
— Estou bem...
Luce
cortou quando avistou mais duas figuras na entrada. Ela quase caiu em prantos
quando viu a cabeça escura e encaracolada de sua mãe e os grandes óculos de
couraça de tartaruga de seu pai.
— Mãe — ela
sussurrou, baixo demais para alguém mais ouvir. — Pai.
Eles se
apressaram em direção à cama, jogando seus braços em volta dela e apertando
suas mãos. Ela queria abraçá-los tanto, mas se sentia fraca demais para fazer
muito mais do que ficar parada e absorver o conforto familiar do toque deles.
Os olhos deles pareciam tão assustados quanto ela se sentia.
— Doçura,
o que aconteceu? — sua mãe perguntou.
Ela não
conseguia dizer uma palavra.
— Eu disse
a eles que você é inocente — a Senhorita Sophia disse,
virando-se para lembrar os policiais. — Ao
diabo com semelhanças estranhas.
Claro
que eles tinham o acidente de Trevor registrado, e é claro que os policiais
iriam encontrá-lo... notavelmente devido à morte do Todd. Luce tinha prática o
bastante com os policiais para saber que ela apenas iria deixá-los frustrados e
irritados.
O
policial magro tinha costeletas longas que estavam ficando grisalhas. O arquivo
aberto dela na mão dele parecia exigir sua atenção total, porque nenhuma vez
ele olhou para ela.
— Srta.
Price — ele disse com um lento sotaque sulista. — Por que
você e o Sr. Hammond estavam sozinhos na biblioteca numa hora tão tardia quando
todos os outros estudantes estavam numa festa?
Luce
olhou para seus pais. Sua mãe estava mordiscando seu batom. O rosto do seu pai
estava tão branco quanto o lençol da cama.
— Eu não
estava com o Todd — ela respondeu, não entendendo
a linha de questionamento. — Eu estava com a Penn, minha
amiga. E a Senhorita Sophia estava lá. Todd estava lendo sozinho e quando o incêndio
começou, eu me perdi da Penn, e Todd foi o único que consegui achar.
— O único
que conseguiu achar... para fazer o quê?
— Espera
um minuto — o Sr. Schultz deu um passo para frente para interromper o
policial. — Isso foi um acidente, devo lembrar-lhe. Você não está interrogando
um suspeito.
— Não, eu
quero responder — Luce disse.
Havia
tantas pessoas nesse minúsculo quarto que ela não sabia para onde olhar. Ela
olhou o policial.
— O que
quer dizer?
— Você é
uma pessoa nervosa, Srta. Price? — Ele
agarrou a pasta. — Você se definiria como
solitária?
— Já
chega — seu pai interrompeu.
— Sim,
Lucinda é uma estudante séria — a Senhorita Sophia
acrescentou. — Ela não tinha nenhuma má vontade em relação a Todd Hammond. O que
aconteceu foi um acidente, nada mais.
O
policial olhou em direção a porta aberta, como se desejando que a Senhorita
Sophia se deslocasse para fora dela.
— Sim,
madame. Bem, com esses casos de reformatório, dar o benefício da dúvida nem sempre
se é o mais responsável...
— Eu lhe
contarei tudo o que sei — Luce disse, embolando seu
lençol em seu punho. — Eu não tenho nada a esconder.
Ela os
conduziu da melhor maneira que conseguiu, falando devagar e claramente para que
não levantasse novas perguntas para seus pais, para que os policiais pudessem
tomar nota. Ela não se deixou escorregar para a emoção, o que parecia ser
exatamente o que todos estavam esperando.
E –
deixando de fora a aparição das sombras – a história fazia bastante sentido.
Eles tinham corrido para a porta traseira. Tinham encontrado a saída no final
de um longo corredor. A escada desprendeu-se rapidamente, inclinando-se para
longe da base, e ela e Todd ambos estiveram correndo com tanta força, não
conseguiram se impedir de tombar escada abaixo. Ela o perdera de vista, batera
sua cabeça forte o bastante para acordar aqui doze horas depois. Isso era tudo
de que ela se lembrava.
Ela
deixou a eles muito pouco que se discutir. Havia apenas a lembrança verdadeira
da noite para que ela combatesse – por conta própria.
Quando
acabou, o Sr. Schultz deu aos policiais uma inclinação de cabeça do tipo estão-satisfeitos?,
e a Senhorita Sophia sorriu de alegria para Luce, como se juntas elas tivessem tido
sucesso em algo impossível. A mãe de Luce soltou um longo suspiro.
— Iremos
refletir sobre isso na delegacia — o
policial magro disse, fechando o arquivo de Luce com tal resignação que parecia
que ele queria ser agradecido por seus serviços.
Então
os quatro saíram da sala e ela ficou sozinha com seus pais.
Ela
lançou-lhes seu melhor olhar me-levem-para-casa. O lábio de sua mão tremeu, mas
seu pai só engoliu em seco.
— Randy
vai te levar de volta para a Sword & Cross essa tarde — ele
disse. — Não pareça tão chocada, doçura. O médico disse que você estava
bem.
— Mais do
que bem — sua mãe acrescentou, mas ela parecia incerta.
Seu pai
deu-lhe um tapinha no braço.
— Te
vemos no sábado. Apenas mais alguns dias.
Sábado.
Ela fechou seus olhos. Dia dos Pais. Ela estivera ansiando-o desde o momento
que chegara na Sword & Cross, mas agora tudo estava tingido pela morte do
Todd. Seus pais pareciam quase ansiosos para deixá-la. Eles tinham um jeito de
não querer exatamente lidar com as realidades de ter uma filha em um
reformatório. Eles eram tão normais. Ela não podia realmente culpá-los.
— Descanse
um pouco agora, Luce — seu pai aconselhou,
abaixando-se para beijá-la sua testa. — Você teve
uma noite longa e difícil.
— Mas...
Ela
estava exausta. Ela fechou seus olhos brevemente e quando os abriu, seus pais
já estavam acenando da entrada.
Ela arrancou
uma rechonchuda flor branca do vaso e a levou lentamente até seu rosto,
admirando as folhas profundamente lobuladas e as pétalas frágeis, as gotas
ainda úmidas de néctar dentro de seu centro. Ela respirou o odor suave e
aromático da flor.
Tentou
imaginar o modo como teriam parecido nas mãos de Justin. Tentou imaginar onde ele
as tinha conseguido, e o que tinha estado em sua mente.
Fora
uma escolha tão estranha de flor. Peônias selvagens não floresciam no pantanal
da Geórgia. Elas nem aderiam ao solo no jardim do seu pai em Thunderbolt. E,
ainda, essas não pareciam quaisquer peônias que Luce já tivesse visto. As
flores eram tão grandes quanto palmas das mãos vertidas em conchas, e o cheiro
a lembrava de algo que ela não conseguia exatamente identificar.
Sinto muito, Justin dissera. Só que Luce não conseguia entender exatamente pelo o quê.Continua...
Claro :)
ResponderExcluir